Aqui artigo para Paraense
Vital Lima: O Caboco que é a Voz da Amazônia
Espia só essa história, parente!
O tal do Vital Lima (Vital Lima de Oliveira, pros mais chegados) não é leso não. O homem é um cantor e compositor daora que nasceu aqui mesmo em Belém, no dia 14 de março de 1973. O trabalho dele é uma mistura pai d'égua da nossa cultura com outros ritmos, fazendo um som que atravessa o rio e vai longe.
De Curumim a Mestre da Música
Desde quando era curumim, o Vital já vivia no meio da música. Ele cresceu ouvindo carimbó, siriá e guitarrada. O caboco aprendeu muita coisa sozinho, na raça, mas depois foi estudar pra ficar escovado. Começou a carreira nos anos 90 e, te mete, já chegou misturando o som da terra com rock e pop.

O Som do Homem é o Bicho
Se tu queres saber como é o estilo dele, te liga:
Mistura Fina: Ele pega o carimbó e a guitarrada e mistura com pop. O som fica só o filé.
Letras que Falam da Gente: Ele canta sobre a nossa terra, o nosso dia a dia e as coisas do povo paraense. Não é lero lero.
Instrumentos: O cara manja muito e usa banjo, maracá e guitarra tudo junto.
Uma Carreira de Respeito (Não é Pavulagem!)
Anos 90: Começou devagar, participando de festivais. Ali a gente já via que ele não era meia tigela.
Anos 2000: Aí o negócio ficou sério. Lançou o álbum “Vital Lima” (2005) e o “Amazonizar” (2008). O homem mostrou serviço e não ficou perambulando sem rumo.
De 2010 pra frente: O sucesso foi grande, um bocado de gente começou a ouvir ele no Brasil todo. O disco “Tecnobregueiro” (2014) e o “Água de Mar” (2019) mostraram que ele é duro na queda.
Parcerias Bacanas
Ele não anda só. Já fez som com a Dona Onete e o Felipe Cordeiro. Quando esses cabocos se juntam, é bacana demais.
Resumo da Ópera
O Vital Lima é cabeça. Ele modernizou nossa música sem esquecer das raízes. É um orgulho pro nosso estado e mostra que o som da Amazônia é o bicho. Se tu ainda não ouviste, mete a cara e vai conferir, porque o som dele não tem potoca (mentira), é de verdade!
Aqui artigo para quem é de fora
A Arquitetura Melódica da Amazônia Urbana: Uma Análise Exaustiva da Trajetória e Obra de Vital Lima
Introdução: O Compositor entre o Rio e a Floresta
A história da Música Popular Brasileira (MPB) é frequentemente narrada através de grandes movimentos sísmicos — a Bossa Nova, a Tropicália, o Clube da Esquina — que redefiniram as coordenadas estéticas da canção nacional. No entanto, paralelamente a esses abalos tectônicos, existem trajetórias que, pela sua consistência técnica e profundidade lírica, constituem o alicerce silencioso e sofisticado da nossa música. A carreira de Vital Lima, cantor, compositor e instrumentista paraense, representa um desses capítulos essenciais, onde a geografia não é apenas um local de origem, mas um estado de espírito estético. Nascido em Belém do Pará, mas artisticamente lapidado na efervescência cultural do Rio de Janeiro das décadas de 1970 e 1980, Vital Lima construiu uma obra que desafia a dicotomia simplista entre o “regional” e o “universal”.1
Este relatório propõe-se a examinar, com rigor analítico e exaustividade documental, os mais de quarenta anos de carreira de Vital Lima. A análise não se restringirá à cronologia discográfica, embora esta sirva de espinha dorsal para a narrativa. O objetivo é investigar como sua formação erudita — tanto musical, sob a tutela de mestres do violão clássico, quanto acadêmica, através da Filosofia — informou uma produção cancionista que transita com naturalidade entre a toada amazônica e o samba-jazz carioca. Investigaremos as parcerias estruturantes de sua vida, nomeadamente com o poeta Hermínio Bello de Carvalho e o compositor Nilson Chaves, e como essas colaborações moldaram não apenas o repertório de Vital, mas a própria identidade da música do Norte do Brasil no cenário nacional.
Além disso, o documento abordará a resiliência do artista diante das transformações da indústria fonográfica. Da era dos grandes festivais televisivos e das trilhas de novelas da Rede Globo, passando pela independência forçada e criativa dos anos 1990 através do selo “Outros Brasis”, até a reafirmação de sua vigência nos palcos em 2024 e 2025.3 Através da análise de críticas, fichas técnicas, entrevistas e registros históricos, desenharemos o perfil de um artista que, como as águas de sua terra, flui continuamente, adaptando-se às margens sem perder a essência de sua nascente.
1. As Raízes em Belém e a Formação do Artista (1955-1974)
1.1. O Contexto Cultural de Belém
Euclides Vital Porto Lima nasceu em Belém, Pará, em 23 de julho de 1955.1 Para compreender a gênese de sua musicalidade, é imperativo situar o ambiente cultural de Belém nas décadas de 1960 e 1970. A capital paraense, embora geograficamente distante do eixo Rio-São Paulo, sempre manteve uma vida cultural pulsante, servindo como porto de entrada para influências caribenhas e mantendo uma tradição robusta de música erudita e folclórica.
Vital cresceu imerso nessa dualidade. Se por um lado a rádio trazia as novidades da Bossa Nova e dos festivais da canção do sudeste, por outro, a tradição local do carimbó, das lendas amazônicas e a onipresença da obra do maestro Waldemar Henrique — o “Villa-Lobos da Amazônia” — criavam um lastro de identidade forte. Não se tratava de uma formação musical passiva; Vital buscou o rigor técnico desde cedo. Seus estudos de violão clássico e técnica violonística com Jodacyl Damasceno foram fundamentais para desenvolver a “mão” do compositor: um violão que não se limita a “rasquear” acordes, mas que constrói linhas melódicas e harmonias complexas, repletas de inversões e tensões que seriam características de sua obra madura.1
1.2. O Batismo de Fogo: O I Festival de Música e Poesia Universitária (1974)
O ano de 1974 marca o ponto de inflexão na vida de Vital Lima. A realização do I Festival de Música e Poesia Universitária em Belém não foi apenas um evento local, mas um catalisador geracional. Foi neste palco que a composição de Vital encontrou sua primeira grande intérprete: uma jovem e então desconhecida Fafá de Belém.2
A simbiose entre a melodia refinada de Vital e a interpretação visceral de Fafá chamou a atenção do júri, presidido por uma figura totêmica da cultura brasileira: Hermínio Bello de Carvalho. Poeta, produtor e descobridor de talentos (responsável por lançar nomes como Clementina de Jesus e Paulinho da Viola), Hermínio possuía um ouvido treinado para identificar não apenas o talento bruto, mas a sofisticação latente.
Ao ouvir a canção de Vital, Hermínio percebeu que aquele jovem compositor possuía uma linguagem que dialogava com a modernidade da MPB sem negar suas raízes. O impacto foi imediato: Hermínio selecionou a canção “Rock'n Roll” de Vital para integrar o repertório do espetáculo “Te Pego Pela Palavra”, que seria estrelado pela veterana cantora Marlene no Rio de Janeiro.2 Este gesto não foi apenas um “apadrinhamento”; foi a validação profissional que motivou a migração de Vital para o centro da indústria cultural.
2. A Travessia e a Consolidação no Rio de Janeiro (1975-1980)
2.1. A Parceria com Hermínio Bello de Carvalho
A mudança para o Rio de Janeiro em meados da década de 1970 inseriu Vital Lima no epicentro da produção musical brasileira. Diferente de muitos artistas que chegavam à “cidade maravilhosa” e se perdiam na boemia ou na luta pela sobrevivência, Vital manteve uma disciplina férrea, conciliando a construção de sua carreira artística com a formação acadêmica. Ele ingressou no curso de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), graduando-se em 1983.1 Esta formação filosófica é uma chave de leitura importante para suas letras posteriores, frequentemente marcadas por um existencialismo poético e uma reflexão sobre a temporalidade e a memória.
Sob a tutela de Hermínio Bello de Carvalho, Vital integrou-se rapidamente à elite musical carioca. A parceria com Hermínio foi prolífica e pedagógica. Hermínio, com sua vasta experiência letrista, forneceu a arquitetura poética para as melodias de Vital, resultando em uma série de canções que formariam a base de seu primeiro disco.
2.2. “Pastores da Noite” (1978): A Estreia Fonográfica
Em 1978, Vital lançou seu primeiro LP solo, “Pastores da Noite”, pela gravadora Tapecar.8 O álbum é um documento histórico da colaboração Vital-Hermínio.
Análise do Álbum:
- Conceito: O disco apresenta uma sonoridade de câmara, intimista, onde o violão de Vital dialoga com arranjos sutis. As letras de Hermínio trazem uma urbanidade noturna, melancólica, que se casa perfeitamente com as harmonias de Vital.
- Recepção e Impacto: A faixa-título, “Pastores da Noite”, rompeu a bolha da crítica especializada ao ser incluída na trilha sonora da novela “Memórias de Amor”, da Rede Globo.7 Na década de 1970, a inclusão em uma novela global era o equivalente contemporâneo a milhões de visualizações em streaming; garantiu a execução massiva da música em todo o território nacional.
- Ficha Técnica: A produção contou com nomes de peso na engenharia de som e direção de estúdio (como Zé Ramalho e Carlos Alberto Sion), indicando que a gravadora apostava na qualidade técnica do produto.10
2.3. O Projeto Pixinguinha e a Vida na Estrada
Paralelamente às gravações, a formação de palco de Vital foi forjada no Projeto Pixinguinha. Iniciativa da Funarte que visava a circulação de artistas por todo o Brasil a preços populares, o projeto colocou Vital na estrada ao lado de gigantes. Ele dividiu palcos e turnês com Carmélia Alves, Antonio Adolfo, Belchior e sua conterrânea Fafá de Belém.2
Essa experiência foi crucial por dois motivos:
- Intercâmbio Musical: A convivência com músicos de diferentes escolas (o forró/baião de Carmélia, o jazz-fusion de Antonio Adolfo, o rock-existencialista de Belchior) enriqueceu o vocabulário harmônico e rítmico de Vital.
- Formação de Público: O Projeto Pixinguinha permitiu que sua música chegasse a plateias fora do eixo Rio-SP, consolidando seu nome como um compositor nacional, e não apenas regional.
3. A Década de 1980: Festivais, Televisão e a Nova Sonoridade
3.1. “Cheganças” (1980) e o Festival MPB-80
O segundo álbum, “Cheganças” (1980), lançado pela Tapecar com distribuição da Som Livre, marca um momento de expansão sonora.8 Se o primeiro disco era noturno e intimista, “Cheganças” busca a luz do dia e a diversidade rítmica.
O ano de 1980 foi dominado pelo Festival MPB-80 da Rede Globo, um evento de proporções gigantescas que tentava reviver a era de ouro dos festivais dos anos 60. Vital Lima classificou a canção “Arisco” (parceria com Sidney Piñon) para o festival. Embora a competição fosse acirrada — com nomes como Oswaldo Montenegro (“Agonia”) e Sandra de Sá —, a participação garantiu a Vital um lugar no álbum oficial do festival, que vendeu centenas de milhares de cópias.2
Análise de “Cheganças”:
A ficha técnica do álbum revela a ambição sonora da época. Com a participação de arranjadores e músicos que definiram o som pop brasileiro dos anos 80, como Lincoln Olivetti, Robson Jorge e Paulo Cezar (baixo), o disco incorpora elementos de funk, soul e jazz-pop.
- Faixas de Destaque: Além de “Arisco”, o álbum traz “O Menino e o Passarinho” (puro lirismo), “Boi Bumbá” (releitura de Waldemar Henrique, antecipando o projeto futuro) e “Caranguejo” (parceria com Hermínio).11
3.2. A Presença na Teledramaturgia e Programas de TV
A relação de Vital com a televisão continuou frutífera. Em 1983, a canção “Tal Qual Eu Sou” (parceria com Hermínio) foi gravada por Lucinha Araújo e tornou-se tema da novela “Sol de Verão”, novamente na Rede Globo.7 Essa recorrência em trilhas sonoras demonstrava a capacidade de Vital de compor melodias “gancho”, que funcionavam dramaturgicamente, sem perder a qualidade harmônica.
Além disso, Vital explorou sua faceta de comunicador e apresentador. Ao lado de Neila Tavares, ele comandou um quadro fixo no programa “Lira do Povo”, na TV Educativa.7 Essa experiência televisiva ajudou a divulgar não apenas seu trabalho, mas a música de outros compositores independentes, reforçando seu papel como um aglutinador cultural.
3.3. O Reconhecimento nos Festivais Regionais
Enquanto consolidava sua carreira no Rio, Vital não abandonou o circuito de festivais, que ainda possuía força no interior do Brasil. Em julho de 1984, venceu o Festival Regional da Canção Popular de Cascavel (PR) com a música “Vale a Pena”.2 Essa vitória em um estado do Sul do Brasil (Paraná) comprova a universalidade de sua linguagem musical, capaz de emocionar jurados e plateias distantes da realidade amazônica.
4. A Alquimia Vital Lima e Nilson Chaves: A Invenção do “Interior”
Se Hermínio Bello de Carvalho foi o parceiro da “chegada” ao Rio, Nilson Chaves representa a parceria da “identidade” e da “alma”. Amigos de infância e vizinhos em Belém, a conexão entre Vital e Nilson transcende a mera colaboração profissional; trata-se de uma simbiose estética que definiu a música moderna do Norte.13
4.1. O Álbum “Interior” (1986)
Em 1986, a gravadora Visom lançou o LP “Interior”, creditado à dupla Nilson Chaves e Vital Lima.9 Este disco é considerado um marco na discografia amazônica.
Conceito e Estética:
O título “Interior” carrega uma polissemia intencional. Refere-se tanto ao interior geográfico do Brasil (a Amazônia, longe do litoral carioca) quanto ao interior psicológico do indivíduo. Musicalmente, o álbum cristaliza o que alguns críticos e estudiosos chamaram de “canoada”: um estilo rítmico e melódico que mimetiza o movimento dos remos na água, criando uma cadência fluida, cíclica e hipnótica.16
Ficha Técnica e Participações:
A produção não economizou em requinte. Gravado no Rio de Janeiro, o disco contou com a participação de Leila Pinheiro (na faixa “Tempodestino”), Antonio Adolfo e Maurício Einhorn (gaita).13 A presença desses músicos conferiu ao álbum uma sonoridade de jazz brasileiro, elevando as composições regionais a um patamar de sofisticação instrumental raro.
Repertório Fundamental:
- “Tempodestino” (Nilson Chaves / Vital Lima): Uma meditação sobre o tempo e o destino, considerada por muitos fãs como a obra-prima da dupla.
- “Flor do Destino”: Outra parceria que se tornou hino no Pará.
- “Abre Alas” e “Forrobodó”: Faixas que mostram a versatilidade rítmica, gravadas também em outros contextos, como no projeto em homenagem a Chiquinha Gonzaga a convite de Antonio Adolfo.2
4.2. O Legado de “Interior”
O sucesso do álbum “Interior” no Norte do país foi avassalador, transformando Vital e Nilson em ícones culturais. O disco provou que era possível fazer música com temática amazônica sem cair no folclorismo exótico ou na simplificação comercial. Eles estabeleceram um padrão de qualidade que influenciaria toda uma geração de músicos paraenses (a chamada MPG – Música Popular de Garagem e movimentos subsequentes).
5. A Década de 1990: Independência e Resgate Histórico
A década de 1990 foi um período de crise para as grandes gravadoras e de reestruturação do mercado musical. Vital Lima, atento a essas mudanças, abraçou a independência fonográfica, criando e utilizando o selo Outros Brasis para gerir sua produção.2
5.1. O Álbum “Vital” (1990)
O primeiro lançamento dessa nova fase foi o LP “Vital” (1990).2 Neste trabalho, o compositor reafirma sua autonomia, apresentando um repertório inteiramente autoral que reflete sua maturidade pós-30 anos. O disco serve como uma ponte entre a sonoridade dos anos 80 e a acústica mais depurada que ele buscaria nos anos seguintes.
5.2. O Projeto “Waldemar” (1992/1994): O Tributo Definitivo
Talvez o projeto mais ambicioso da década tenha sido o reencontro com Nilson Chaves para o álbum “Waldemar”, dedicado à obra do maestro Waldemar Henrique. Lançado originalmente em LP em 1992 e relançado em CD em 1994, este trabalho é uma peça de arqueologia musical afetiva.7
Waldemar Henrique (1905-1995) é a figura central da música paraense, tendo recolhido lendas e temas indígenas e os traduzido para a linguagem do lied erudito e da canção popular. Vital e Nilson assumiram a responsabilidade de “traduzir” Waldemar para as novas gerações.
Recepção Crítica:
O álbum foi aclamado pela crítica nacional. O jornal O Globo o listou como um dos dez melhores lançamentos do ano de 1994.14 A crítica elogiou a delicadeza dos arranjos e a interpretação respeitosa, mas inovadora, que despiu as canções da grandiloquência operística tradicional, trazendo-as para um terreno mais próximo da MPB camerística. Faixas como “Uirapuru”, “Matintaperera” e “Boi Bumbá” ganharam leituras definitivas.
5.3. “Chão do Caminho” (1997): Olhando pelo Retrovisor
Fechando a década, Vital produziu a coletânea “Chão do Caminho” (1997), remasterizando seus sucessos lançados em vinil para o formato CD, que então dominava o mercado. O álbum não foi apenas uma reciclagem; incluiu duas faixas inéditas: a canção-título e “Leopardo” (anteriormente gravada por Marisa Gata Mansa), oferecendo aos fãs um novo atrativo.7
6. O Novo Milênio: Teatro, Reconhecimento e Retorno às Origens (2000-2010)
6.1. O Compositor de Teatro e a Premiação
A versatilidade de Vital Lima encontrou um novo canal de expressão no teatro. Sua parceria com o letrista Jamil Damous rendeu frutos notáveis na dramaturgia. Juntos, compuseram trilhas para peças como “O Cândido Chico Xavier” e “Bonequinha de Pano”, esta última baseada na obra de Ziraldo e estrelada por Zezé Fassina.
O reconhecimento da crítica especializada veio em 2003, quando Vital e Jamil receberam o prestigioso Prêmio Maria Clara Machado de “Melhor Canção/Trilha de Teatro Infantil”.7 Este prêmio sublinha a capacidade de Vital de comunicar com diferentes faixas etárias, mantendo a sofisticação melódica mesmo em obras voltadas para o público infantil.
6.2. “Canto Vital” (2002) e “Das Coisas Simples da Vida” (2005)
Em 2002, a cidade de Belém prestou uma homenagem em vida ao seu filho ilustre. O show “Canto Vital”, gravado ao vivo no Teatro Margarida Schiwazzapa, reuniu 16 dos maiores intérpretes da música paraense para cantar a obra de Vital Lima. O registro em CD, lançado no mesmo ano, é um tributo à sua importância como formador de uma cena musical.9
Três anos depois, em 2005, Vital lançou o álbum de estúdio “Das Coisas Simples da Vida”. Gravado em Belém, o disco contou com músicos locais de excelência, como Adelbert Carneiro (baixo), Luiz Pardal e Esdras de Souza.9 A produção de Marco André e Idan Góes buscou uma sonoridade orgânica, refletindo o título do álbum. O repertório foca na beleza do cotidiano e na valorização das pequenas epifanias da vida amazônica e urbana.
6.3. “Sina de Ciganos” (2011)
A parceria com Nilson Chaves foi novamente celebrada com o lançamento do DVD e CD “Sina de Ciganos” (gravado em 2009, lançado em 2011). Este registro audiovisual capturou a química de palco da dupla, apresentando um apanhado histórico de suas colaborações. O título “Sina de Ciganos” alude à vida itinerante dos músicos e à sua natureza inquieta, sempre em movimento entre cidades e gêneros musicais.7
7. O Retorno Fonográfico e a Maturidade: “O Que Não Tem Fim” (2015)
Após um hiato de dez anos sem um álbum de estúdio inteiramente autoral e inédito, Vital Lima retornou em 2015 com o CD “O Que Não Tem Fim”, lançado pelo selo Mills Records.7
7.1. Análise do Álbum
Produzido em parceria com Fernando Carvalho, o disco é um manifesto de vitalidade artística aos 60 anos de idade e 40 de carreira.
- Conceito: A faixa de abertura, “Sobreviventes” (parceria com Ronald Junqueiro), faz uma ponte direta com o álbum anterior (“Das Coisas Simples da Vida”), sugerindo uma narrativa contínua. O tema central é o amor em suas diversas facetas: romântico, fraternal, existencial.
- Parcerias e Convidados: O álbum é um grande encontro de gerações. Traz duetos com companheiros de longa data como Leila Pinheiro (na faixa “Pedras de Lioz”, parceria de Vital com Leandro Dias) e Nilson Chaves (na faixa-título). Abre espaço também para a nova geração, como Arthur Nogueira (na faixa “O Parkour”) e Patrícia Bastos.
- O Reencontro com Hermínio: O momento mais emocionante do disco é a faixa “Enunciação”, onde Hermínio Bello de Carvalho recita um poema de sua autoria, selando quatro décadas de amizade e criação conjunta.
- Recepção Crítica: O crítico Mauro Ferreira, em seu blog “Notas Musicais”, avaliou o álbum como uma safra autoral de “bom nível”, destacando a importância histórica dos reencontros, embora tenha ressalvado que o disco “jamais arrebata”, sugerindo uma obra mais contemplativa do que explosiva.20
8. Vital Lima na Contemporaneidade (2020-2025)
Nos anos recentes, Vital Lima tem demonstrado uma atividade vigorosa, reafirmando seu lugar no panteão da MPB e adaptando-se às novas dinâmicas de shows pós-pandemia.
8.1. A Celebração da Obra e a Memória
A preservação da memória musical tem sido uma constante. Em 2014, a cantora Alba Maria lançou o DVD “Simplesmente Vital”, um projeto inteiramente dedicado à obra do compositor, gravado no Teatro Waldemar Henrique. A participação do próprio Vital neste projeto endossa a passagem de bastão para novas vozes interpretarem seu cancioneiro.7
8.2. A Agenda de Shows 2024-2025
Vital Lima continua sendo um artista de palco requisitado, especialmente em projetos que celebram a história da música paraense.
- “Tempo e Destino” (2024): Em novembro de 2024, Vital reuniu-se com Nilson Chaves e o compositor paulista Celso Viáfora para o show “Tempo e Destino” no Teatro Municipal de Ananindeua. O espetáculo celebrou as parcerias transregionais do trio, com destaque para canções como “Não vou sair” e “Olhando Belém”.3
- “Certas Canções” (2025): Para novembro de 2025, está agendado o show “Certas Canções”, novamente ao lado de Nilson Chaves, no Teatro Margarida Schivasappa em Belém. A proposta do espetáculo é uma “viagem sensível” pelo repertório afetivo, reafirmando a conexão profunda entre os artistas e seu público fiel.4
Além dos palcos, Vital mantém presença na mídia. Em abril de 2024, participou do programa “Sem Censura Pará” (TV Cultura), discutindo os 40 anos de parceria com Nilson Chaves e Marco André, o que reforça o caráter documental e histórico de sua carreira atual.26
9. Análise Estética: A “Canoada” e o Violão Filosófico
9.1. O Estilo “Canoada”
A crítica musical e acadêmica frequentemente associa a obra de Vital Lima (e de Nilson Chaves) ao estilo denominado “canoada”. Este termo, cunhado no contexto da música paraense, refere-se a uma célula rítmica que emula o bater do remo na água dos rios amazônicos. Diferente do carimbó, que é festivo e dançante, a canoada é contemplativa, cíclica e melancólica.
Em músicas como “Interior” e “Tempodestino”, a divisão rítmica do violão sugere esse balanço constante, criando uma atmosfera que transporta o ouvinte para a paisagem fluvial sem a necessidade de onomatopeias óbvias. É uma tradução instrumental da geografia.16
9.2. Harmonia e Letra
A formação em Filosofia de Vital reflete-se na densidade de suas letras. Temas como a transitoriedade (“Tempodestino”, “O Que Não Tem Fim”), a memória (“Mar Memória”, “Pastores da Noite”) e a resistência (“Sobreviventes”) são recorrentes.
Harmonicamente, Vital é um herdeiro da escola pós-bossa nova. Ele utiliza acordes com extensões (nona, décima primeira, décima terceira) e movimentos de baixo que enriquecem a melodia. Seu violão é orquestral; ele não apenas acompanha, mas contra-canta a voz principal.
10. Discografia Completa e Intérpretes
Para fins de referência e consulta, apresentamos a discografia detalhada e a lista de intérpretes que gravaram Vital Lima.
Tabela 1: Discografia Principal de Vital Lima
| Ano | Título | Formato | Gravadora | Parceria/Notas |
| 1978 | Pastores da Noite | LP | Tapecar | Letras de Hermínio B. de Carvalho. |
| 1980 | Cheganças | LP | Tapecar/Som Livre | Inclui “Arisco” (MPB-80). |
| 1986 | Interior | LP | Visom | Com Nilson Chaves. Marco da MPB nortista. |
| 1990 | Vital | LP | Outros Brasis | Primeiro lançamento independente pelo selo próprio. |
| 1992 | Waldemar | LP | Outros Brasis | Com Nilson Chaves. Tributo a Waldemar Henrique. |
| 1994 | Waldemar | CD | Outros Brasis | Relançamento aclamado pela crítica. |
| 1997 | Chão do Caminho | CD | Outros Brasis | Coletânea com faixas inéditas. |
| 2002 | Canto Vital | CD | Independente | Tributo ao vivo com vários intérpretes paraenses. |
| 2005 | Das Coisas Simples da Vida | CD | Independente | Gravado em Belém. |
| 2011 | Sina de Ciganos | DVD/CD | Independente | Com Nilson Chaves. Show ao vivo. |
| 2015 | O Que Não Tem Fim | CD | Mills Records | Álbum de estúdio com inéditas. |
Tabela 2: Principais Intérpretes de Vital Lima
| Intérprete | Canções Gravadas (Exemplos) | Observação |
| Fafá de Belém | Várias composições de festivais | Primeira grande intérprete (1974). |
| Simone | Diversas faixas | Gravou em álbuns de sucesso nacional. |
| Lucinha Araújo | “Tal Qual Eu Sou” | Tema da novela Sol de Verão (1983). |
| Leila Pinheiro | “Tempodestino”, “Pedras de Lioz” | Parceira constante em shows e discos. |
| Emílio Santiago | Várias | Dividiu palco no Projeto Seis e Meia. |
| Elizeth Cardoso | Canções românticas/samba | A “Divina” gravou Vital, atestando sua qualidade. |
| Zé Renato | “Litoral” | Parceria (Boca Livre). |
| Alba Maria | DVD “Simplesmente Vital” | Dedicou um álbum inteiro à obra de Vital (2014). |
Conclusão
A trajetória de Vital Lima é um exemplo de integridade artística e excelência técnica. Ao longo de cinco décadas, ele conseguiu a rara proeza de ser, simultaneamente, um ícone regional — guardião e renovador da tradição musical amazônica — e um compositor universal, cuja obra dialoga com o jazz, a música erudita e o melhor da tradição cancionista brasileira.
Sua migração para o Rio de Janeiro nos anos 70 não significou um abandono de suas raízes, mas sim a busca pelas ferramentas necessárias para expressá-las com maior clareza e alcance. As parcerias com Hermínio Bello de Carvalho e Nilson Chaves funcionam como os dois hemisférios de seu cérebro criativo: o primeiro trazendo o rigor poético e a malandragem lírica da cidade, o segundo ancorando a melodia na vastidão e no tempo lento da floresta.
Em 2025, a persistência de Vital Lima nos palcos e a contínua redescoberta de sua obra por novas gerações (como Arthur Nogueira e Patrícia Bastos) demonstram que sua música não é um artefato de museu, mas um organismo vivo. Vital Lima permanece como um “pastor da noite” e do dia, guiando ouvintes através das águas complexas e belas da cultura brasileira, provando que, em sua arte, o que é vital é, de fato, o que não tem fim.
Referências citadas
- Vital Lima – Dicionário Cravo Albin, acessado em dezembro 5, 2025, https://dicionariompb.com.br/artista/vital-lima/
- Vital Lima – Wikipédia, a enciclopédia livre, acessado em dezembro 5, 2025, https://pt.wikipedia.org/wiki/Vital_Lima
- Show Tempo e Destino com Nilson Chaves/Vital Lima e Celso Viafora em Ananindeua, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.sympla.com.br/evento/show-tempo-e-destino-com-nilson-chaves-vital-lima-e-celso-viafora/2690517
- Nilson Chaves e Vital Lima apresentam o show ‘Certas Canções' em Belém – O Liberal, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.oliberal.com/cultura/musica/nilson-chaves-e-vital-lima-apresentam-o-show-certas-cancoes-em-belem-1.1043230
- Vital Lima e Hermínio Bello de Carvalho, dupla poética – Neto Rocha & Marcello Gabbay, acessado em dezembro 5, 2025, https://ocampoeacidade.wordpress.com/2013/08/21/vital-lima-e-herminio-bello-de-carvalho-dupla-poetica/
- Vital Lima – Página de artista no site Galeria Musical, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.galeriamusical.com.br/artista.php?cod_artista=607
- PRESS RELEASE – Vital LIma, acessado em dezembro 5, 2025, http://www.vitallima.com.br/phone/press-release.html
- Discografia II – Cristovão Bastos, acessado em dezembro 5, 2025, https://cristovaobastos.blogspot.com/p/discografia.html
- Vital Lima – MPBNet, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.mpbnet.com.br/musicos/vital.lima/index.html
- “Discos, Música e Informação”: outubro 2017, acessado em dezembro 5, 2025, http://discosmusicaeinformacao.blogspot.com/2017/10/
- “Discos, Música e Informação”: 2020, acessado em dezembro 5, 2025, http://discosmusicaeinformacao.blogspot.com/2020/
- 1980 – MPB 80 – Festivales de MPB – Discografía Completa, acessado em dezembro 5, 2025, http://festivalesdempb.blogspot.com/2011/02/1980-mpb-80.html
- Vital Lima – Toque Musical, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.toque-musicall.com/?cat=514
- Nilson Chaves – Wikipédia, a enciclopédia livre, acessado em dezembro 5, 2025, https://pt.wikipedia.org/wiki/Nilson_Chaves
- Álbum – INTERIOR – Nilson Chaves & Vital Lima – IMMuB, acessado em dezembro 5, 2025, https://immub.org/album/interior-nilson-chaves-vital-lima
- canção popular e política em belém: sonoridades “caboclas” e ações nacionais desenvolvimentistas, acessado em dezembro 5, 2025, https://revistas.uece.br/index.php/bilros/article/download/7633/6400/29720
- Untitled – Atena Editora, acessado em dezembro 5, 2025, https://atenaeditora.com.br/catalogo/dowload-post/58223
- álbum de Nilson Chaves & Vital Lima – Sina de Ciganos – Apple Music, acessado em dezembro 5, 2025, https://music.apple.com/br/album/sina-de-ciganos/1649303978
- Vital Lima lança o disco ‘O que não tem fim' – UAI, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.uai.com.br/app/noticia/musica/2015/10/06/noticias-musica,172633/vital-lima-lanca-o-disco-o-que-nao-tem-fim.shtml
- Vital Lima escoa produção autoral e reúne … – Notas Musicais, acessado em dezembro 5, 2025, http://www.blognotasmusicais.com.br/2015/07/vital-lima-escoa-producao-autoral-e.html
- julho 2015 – Notas Musicais, acessado em dezembro 5, 2025, http://www.blognotasmusicais.com.br/2015/07/
- Alba Maria homenageia Vital Lima – Portal SUCESSO!, acessado em dezembro 5, 2025, https://web.portalsucesso.com.br/noticias/alba-maria-homenageia-vital-lima
- SECULT | Show “Tempo e Destino” marca emocionante reencontro no Teatro Municipal de Ananindeua, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.ananindeua.pa.gov.br/secult/noticia/8404/show-tempo-e-destino-marca-emocionante-reencontro-no-teatro-municipal-de-ananindeua
- Nilson Chaves e Vital Lima apresentam o show “Certas Canções” em Belém nos próximos dias 26 e 27 – Jornal do Brás, acessado em dezembro 5, 2025, https://jornaldobras.com.br/noticia/98512/nilson-chaves-e-vital-lima-apresentam-o-show-certas-cancoes-em-belem-nos-proximos-dias-26-e-27/amp
- BELÉM/PA | Show | “Certas Cançóes” com Nilson Chaves e Vital Lima – Agenda de Eventos, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.portalcitynews.com.br/agenda-de-eventos/517-belempa–show–quotcertas-cancoesquot-com-nilson-chaves-e-vital-lima
- Sem Censura Pará – Nilson Chaves, Vital Lima e Marco André – 11/04/2024 – YouTube, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.youtube.com/watch?v=t-ELo_ZA8aQ
📚 Glossário do Ver-o-Peso: Traduzindo o Amazonês
Bacana: É o mesmo que legal, algo que tu gostaste ou achaste bonito .
Caboco (Caboclo): Para nós, vai além da mistura de etnias; é o interiorano, a pessoa simples, com seus costumes e linguagem própria .
Cabeça: Diz-se da pessoa que é muito inteligente .
Curumim: Significa menino novo, garoto, criança ou rapaz jovem .
Daora: Se a pessoa gostou de algo, ela diz que é “daora” .
Duro na queda: Alguém difícil de se abalar ou ser derrotado, que enfrenta barreiras e não desiste fácil .
É o bicho: Uma forma de elogiar alguém quando faz algo espetacular ou uma arte .
Escovado: É o cara malandro .
Lero lero: É jogar conversa fora, falar aleatoriamente sem compromisso .
Leso: É o cara abestalhado, sem noção, ou alguém que teve uma falta de raciocínio momentâneo .
Mano(a): Forma de tratamento entre amazonenses, servindo para irmãos, amigos ou até conhecidos .
Manja: Quando a pessoa “sabe muito”, é muito boa no que faz .
Meia tigela: Refere-se a quem faz as coisas pela metade ou só finge que sabe .
Mete a cara: É um incentivo! Significa “toma coragem e siga em frente” .
Pai d'égua: Expressão local para algo muito legal .
Pavulagem: Quando a pessoa tá se achando, metida, ostentando ou se exibindo .
Perambulando: Quando a pessoa não tem paradeiro certo .
Só o Filé: Aquilo que é o máximo, mais do que legal .
Um bocado: Quer dizer muito, uma grande quantidade .



O Som do Homem é o Bicho