Égua da Produção! O Pará tá Estourado, mas cadê o Chocolate, Parente?
Sabe aquela história de que a Bahia era a terra do cacau? Pois esquece, maninho! Isso já era. Quem manda na parada agora é o Pará. O negócio aqui tá pai d'égua!
1. O Pará Deu uma Lapada na Concorrência
Espia só esses números pra tu não dizer que é potoca minha:
Somos os Maiorais: O Pará tá produzindo mais de 152 mil toneladas de cacau. Isso é mais da metade (51,8%) de todo o cacau do Brasil!.
A Bahia ficou no vácuo: Os baianos tão produzindo umas 140 mil toneladas. A gente passou eles faz tempo.
Por que a gente é o bicho? Enquanto lá na Bahia deu panema com praga e seca, aqui a chuva ajuda e a terra é boa demais.
Mas aí tu me perguntas: “Se a gente tem tanto cacau, por que eu não vejo fábrica de chocolate brocando aqui em Belém ou Altamira?”. Aí que entra a fuleragem, parente.
2. O Mistério do Chocolate que “Pega o Beco”
Tu acreditas que 95% do nosso cacau vai embora daqui sem virar chocolate?. É de lascar! O motivo é uma mistura de preguiça com falta de estrada e imposto doido.
O problema do calor: Levar chocolate pronto da Transamazônica pro Sul do Brasil é bronca. O chocolate derrete, precisa de caminhão gelado, é caro que só. Já levar a amêndoa seca é moleza, joga no caminhão e tchau e bença.
As fábricas já tão lá: As empresas gringas (essas multinacionais cheias de pavulagem) já têm as máquinas tudinho lá na Bahia faz tempo. Elas não querem gastar pra construir outra aqui.
3. A “Trairagem” da Guerra Fiscal (Bahia x Pará)
Parente, isso aqui é pra te deixar impimado. A Bahia faz um migué danado pra levar nosso cacau.
O Pulo do Gato: O governo de lá dá um desconto monstro no imposto (crédito presumido) pra indústria que comprar cacau de fora (ou seja, o nosso!).
O Resultado: Fica mais barato pra eles buscarem o cacau aqui na baixa da égua do que a gente processar aqui. É uma drenagem discunforme da nossa riqueza.
4. E o Governo? Tá Leso é?
Rapaz, aqui o negócio fica feio. Tem um fundo chamado Funcacau que era pra ajudar os produtores e trazer fábrica. Sabe quanto eles gastaram em assistência técnica e fomento industrial em 2023?
ZERO REAIS! É isso mesmo, parente. Tinham mais de 1 milhão programado e executaram R$ 0,00.
A desculpa foi “reprogramação”. Ah, vá te lascar! O dinheiro tava lá e não te esperô, ninguém usou. Isso é falta de gestão braba.
5. Mas tem uma Luz no Fim do Túnel (Chocolate de Rocha!)
Nem tudo tá cagado. Tem uma galera que não é boca mole e tá fazendo chocolate aqui mesmo.
Os Ribeirinhos tão brocando: O cacau de Medicilândia e de Tomé-Açu tá ganhando prêmio internacional de melhor do mundo!.
Bean to Bar: É o tal do chocolate fino (“da amêndoa à barra”). É coisa chibata! As cooperativas tão exportando cacau de cheiro, coisa fina pro Japão e Europa.
Resumo da Ópera: Bora Acordar!
O Pará tá rico de produto, mas pobre de indústria. A gente tá sendo leso, entregando o ouro (cacau) pra Bahia fazer a joia (chocolate).
O Produtor: Sofre com estrada ruim e ganha pouco comparado ao chocolate.
O Estado: Arrecada mixaria porque exporta matéria-prima (que não paga imposto pela Lei Kandir).
Tem que acabar com essa leseira! O Pará tem que ser o rei do cacau E do chocolate. Te orienta, governo! Bora logo valorizar o nosso produto! Posso encomendamos esse estudo abaixo:
Dinâmica Econômica, Tributária e Industrial da Cadeia do Cacau no Brasil: A Hegemonia Paraense, o Paradoxo da Verticalização e os Desafios da Gestão Pública
Sumário Executivo
Este relatório de pesquisa apresenta uma análise exaustiva e multidimensional sobre a configuração atual da cacauicultura no Brasil, com foco predominante no estado do Pará. A investigação responde às indagações sobre a liderança produtiva paraense em contraste com sua incipiente industrialização, atribui responsabilidades administrativas baseadas na execução orçamentária e legislativa, detalha a carga tributária incidente sobre o produtor e estima os impactos na arrecadação estatal.
A tese central deste documento é que o Pará se tornou uma “colônia interna” de fornecimento de matéria-prima para o parque industrial da Bahia, sustentada por uma estrutura tributária federal (Lei Kandir) que desestimula a agregação de valor na origem, e por uma agressiva política de incentivos fiscais do estado da Bahia, que drena a amêndoa paraense. Adicionalmente, identificam-se gargalos administrativos severos na gestão de fundos estaduais (Funcacau) que falharam em executar orçamentos cruciais para a assistência técnica e o fomento industrial.
Os dados utilizados baseiam-se em relatórios do IBGE, Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Secretaria da Fazenda do Estado do Pará (SEFA/PA), Secretaria da Fazenda da Bahia (SEFAZ/BA) e legislação vigente até o ano fiscal de 2024/2025.
1. O Novo Eixo Geoeconômico do Cacau: A Ascensão do Pará e o Cenário Nacional
A geografia do cacau no Brasil sofreu uma transformação tectônica nas últimas duas décadas. Historicamente centrado no Sul da Bahia, o eixo de produção migrou decisivamente para a Amazônia, especificamente para a região da Transamazônica e do Sudeste Paraense. Esta seção detalha os números que comprovam essa hegemonia e o contexto global que a impulsiona.
1.1. Contexto Global e a Janela de Oportunidade Brasileira
Para compreender a pressão sobre a produção paraense, é imperativo analisar o cenário internacional. Os dois maiores fornecedores mundiais, Costa do Marfim e Gana, enfrentam uma crise estrutural severa. O envelhecimento dos pomares, somado a eventos climáticos extremos e, crucialmente, a proliferação do Cacao Swollen Shoot Virus (CSSV), reduziu drasticamente a oferta global.1
Este vácuo na oferta disparou os preços internacionais, criando uma oportunidade única para o Brasil. Contudo, a resposta produtiva não foi uniforme em território nacional. Enquanto a Bahia luta para recuperar lavouras dizimadas pela Vassoura-de-Bruxa (Moniliophthora perniciosa) e enfrenta secas cíclicas, o Pará emergiu com vigor devido a fatores climáticos favoráveis (regime de chuvas amazônico) e à ausência inicial de grandes pragas sistêmicas, aliada a solos de alta fertilidade natural em áreas de fronteira agrícola.1
1.2. Análise da Produção Nacional: O Déficit e os Líderes
O Brasil possui um parque industrial moageiro robusto, capaz de processar volumes superiores à produção nacional atual. Existe um déficit estrutural: o país consome internamente e exporta derivados que exigem cerca de 300 mil toneladas/ano, mas a produção interna oscila, exigindo importações (drawback) de amêndoas africanas para manter as fábricas de Ilhéus operando.3
Dentro deste cenário de escassez, a polarização é evidente. Pará e Bahia, juntos, respondem por aproximadamente 95% da produção nacional.3
Tabela 1.1: Comparativo de Produção e Estrutura (Estimativas 2023/2024)
Indicador | Estado do Pará (PA) | Estado da Bahia (BA) | Fonte |
Produção Estimada (2024) | > 152.000 toneladas | ~140.000 – 150.000 ton | 4 |
Participação Nacional | 51,80% (Líder Nacional) | ~43% – 45% | 4 |
Valor Bruto da Produção (2023) | R$ 2,4 Bilhões | R$ 1,8 Bilhões (Exportação) | 4 |
Área em Expansão | +8.000 hectares/ano | Estabilização/Renovação | 4 |
Número de Produtores | ~31.500 | > 40.000 | 4 |
Perfil Predominante | Agricultura Familiar / Assentamentos | Misto (Fazendas + Pequenos) | 2 |
O Pará não apenas ultrapassou a Bahia em volume absoluto, atingindo mais de 152 mil toneladas projetadas para 2024, como também apresenta as maiores médias de produtividade do mundo.4 A produção paraense é caracterizada pelo cultivo em sistemas agroflorestais (SAFs) na Transamazônica (municípios de Medicilândia, Altamira, Uruará) e no Sudeste do estado (São Félix do Xingu, Tucumã).2
1.3. A Recuperação Baiana
É necessário registrar que a Bahia não está estagnada. O estado demonstrou resiliência, dobrando o valor de suas exportações de cacau e derivados em 2024 para US$ 434 milhões, impulsionado pela alta do dólar e dos preços de commodities, embora o volume físico tenha crescido modestamente (1,3%).5 A Bahia mantém a liderança no processamento, mas perdeu a hegemonia na produção primária.
2. O Paradoxo da Industrialização: Por que o Pará não Produz Chocolate?
A pergunta central da pesquisa — “Por que o estado do Pará é o maior produtor de Cacau do Brasil e não desenvolve a produção de chocolate?” — revela um sintoma clássico de economias de enclave. A resposta não reside na incapacidade técnica, mas em uma complexa teia de Logística, Inércia Industrial e Guerra Fiscal.
2.1. A Geografia da Indústria Moageira
A produção de chocolate em escala industrial ocorre em duas etapas principais:
- Moagem (Grinding): Transformação da amêndoa em líquor (massa), manteiga e torta (pó) de cacau. Esta etapa é dominada por poucas multinacionais (Cargill, Olam, Barry Callebaut).
- Manufatura de Chocolate: Uso dos derivados para fazer o produto final (Nestlé, Garoto, Mondelez).
O parque industrial de moagem do Brasil foi instalado no Sul da Bahia (Ilhéus/Itabuna) décadas atrás, quando a Bahia era a única produtora relevante. Essas fábricas representam investimentos de bilhões de dólares (CAPEX elevado) e possuem vida útil longa.
Para as multinacionais, é economicamente mais viável transportar a amêndoa do Pará para as fábricas já amortizadas na Bahia do que construir novas plantas na Amazônia. Cerca de 95% da produção paraense é enviada para essas indústrias na Bahia ou exportada in natura.3
2.2. A Barreira Logística e o Custo Brasil
A industrialização no Pará enfrenta o desafio de escoamento do produto final.
- O Produto Final é Sensível: O chocolate é um produto perecível ao calor e de alto valor agregado. Transportar chocolate pronto do interior do Pará (Transamazônica) para os grandes centros consumidores do Sul/Sudeste (São Paulo/Rio) é logisticamente complexo e caro (necessita de refrigeração).
- A Matéria-Prima é Resistente: A amêndoa seca de cacau é uma carga “seca”, não perecível no curto prazo, e fácil de transportar em caminhões comuns ou barcaças.
- Conclusão Logística: É mais barato transportar a amêndoa do Pará para a Bahia (processar lá) e depois distribuir para o Sudeste, do que processar no Pará e tentar distribuir o chocolate refrigerado por estradas precárias como a BR-230.7
2.3. A Ausência de Políticas de Verticalização Eficazes
Embora o governo do Pará cite a verticalização como meta, a realidade dos dados mostra timidez. Apenas 5% da produção é absorvida localmente.4 O estado focou seus recursos (como veremos na análise do Funcacau) em aumentar a base produtiva (sementes, assistência agronômica) 8, negligenciando a infraestrutura necessária para a indústria (distritos industriais com energia estável, saneamento e incentivos fiscais competitivos com a Bahia).
3. A Guerra Fiscal: Como a Bahia “Drena” o Cacau do Pará
Um dos fatores mais determinantes para a não-industrialização no Pará é a estrutura tributária agressiva do estado da Bahia, que incentiva a compra de amêndoas de outras unidades da federação.
3.1. O Mecanismo de Crédito Presumido da Bahia
A legislação baiana, através de decretos e regulamentos de ICMS (como o Decreto 6.284/97 e atualizações na Lei 14.775/2024), criou um ambiente onde a indústria moageira local é subsidiada para comprar cacau de fora.
- Funcionamento: Quando uma indústria baiana compra cacau do Pará, ela paga o ICMS interestadual (12%) ao Pará (teoricamente). No entanto, o estado da Bahia concede “Créditos Presumidos” de ICMS na saída dos produtos industrializados ou na entrada da matéria-prima, que na prática anulam ou reduzem drasticamente o custo tributário dessa aquisição.9
- Efeito Prático: Para a indústria instalada em Ilhéus, o custo fiscal de trazer cacau do Pará é mitigado pelo governo baiano. Isso artificialmente mantém a competitividade das fábricas baianas, mesmo estando a milhares de quilômetros da matéria-prima. O governo da Bahia utiliza o PROBAHIA e o DESENVOLVE para aprovar bilhões em incentivos, perpetuando essa lógica.12
3.2. A Defesa (Frágil) do Pará
O Pará instituiu a Lei 9.389/2021 e programas de incentivo que oferecem redução de base de cálculo e crédito presumido de 50% a 95% para indústrias que se instalarem no estado.14 Contudo, para uma multinacional, o incentivo fiscal do Pará teria que ser superior ao custo de desmobilizar da Bahia e construir uma nova fábrica, além de compensar o custo logístico extra de distribuição do chocolate. Até o momento, essa equação não fechou para as grandes empresas.
4. Carga Tributária do Produtor e Arrecadação Estatal
A análise financeira da cadeia revela quem paga a conta e quem arrecada (ou deixa de arrecadar).
4.1. Quanto o Produtor Paga de Imposto?
A tributação sobre o produtor rural no Pará varia conforme o destino da venda. É fundamental distinguir entre a carga tributária formal e a econômica (quem realmente arca com o custo).
- Venda Interna (Dentro do Pará):
- Mecanismo: Diferimento do ICMS.15
- Custo Imediato: Zero. O regulamento do ICMS do Pará difere (adia) o pagamento do imposto para a etapa seguinte (indústria ou exportação). O produtor não emite guia de recolhimento de ICMS ao vender para uma cooperativa local ou atravessador interno.
- Venda Interestadual (Para a Bahia):
- Mecanismo: ICMS de 12% sobre a Pauta Fiscal.
- Custo: Embora legalmente o imposto incida sobre a operação, economicamente ele é descontado do preço pago ao produtor.
- A Pauta Fiscal: O estado fixa um valor de referência. A pauta para 2024/2025 para “Cacau (Amêndoa Seca)” gira em torno de R$ 6,90/kg (baseada em pautas regionais e dados do Amazonas como proxy, já que o valor exato do Pará varia mensalmente, mas segue a média regional).17
- Cálculo: Se a pauta é R$ 6,90, o imposto devido é R$ 0,82 por kg (12%). Se o preço de mercado é R$ 20,00/kg, o imposto real representa cerca de 4,1% do valor da venda, mas é calculado sobre a pauta subvalorizada. Se a venda for feita com nota fiscal cheia sobre o valor real, o imposto sobe.
- Funrural (Contribuição Previdenciária):
- Incide sobre a receita bruta da comercialização. A alíquota para produtor pessoa física é de 1,5% (1,2% INSS + 0,1% RAT + 0,2% SENAR). Este valor é retido pelo adquirente.18
Tabela 4.1: Resumo da Carga Tributária Direta do Produtor
Tributo | Fato Gerador | Alíquota Efetiva / Valor | Observação |
ICMS (Interno) | Venda p/ Indústria no PA | 0% (Diferido) | Pago pela indústria na saída futura. |
ICMS (Interestadual) | Venda p/ Bahia | 12% (sobre Pauta ou Valor Real) | Frequentemente subfaturado ou sonegado sem fiscalização. |
Funrural | Venda da Produção | 1,5% sobre Receita Bruta | Retido na fonte (Federal). |
ITR | Propriedade da Terra | Variável (Baixo) | Imposto Federal/Municipal anual.18 |
4.2. Quanto o Estado do Pará Arrecada?
O paradoxo do cacau paraense é que, apesar de produzir bilhões em riqueza (VBP de R$ 2,4 bilhões 4), a arrecadação direta de ICMS é desproporcionalmente baixa devido à legislação federal.
- O “Buraco” da Lei Kandir: A Lei Complementar 87/96 isenta de ICMS as exportações de produtos primários. Como grande parte do cacau é exportada (direta ou indiretamente), o estado não arrecada nada nessas operações. O Pará luta judicialmente por compensações e garantiu um acordo de R$ 4,5 bilhões (parcelados em 17 anos) para cobrir perdas históricas de todos os setores (minério e agro) 19, mas isso não é receita tributária direta corrente gerada pela safra atual.
- Arrecadação na Saída para a Bahia: Esta é a principal fonte de receita tributária do cacau in natura. Com a produção de 150 mil toneladas, se considerarmos que 90% vai para outros estados a um preço de pauta conservador de R$ 6,90/kg (apenas para fins de base de cálculo mínima):
- Volume: 135.000.000 kg.
- Base de Cálculo (Pauta): R$ 931,5 milhões.
- ICMS Potencial (12%): ~R$ 111 milhões/ano.
- Nota: Este valor é uma estimativa teórica. A sonegação fiscal (transporte sem nota ou “meia nota”) reduz drasticamente esse montante, evidenciado pelas constantes apreensões da SEFA no posto fiscal do Araguaia.20
Conclusão sobre Arrecadação: O estado arrecada uma fração mínima do potencial da cadeia. Se o cacau fosse transformado em chocolate no Pará (alíquota interna de 17-19% sobre um produto de valor agregado 10x maior), a arrecadação poderia ser multiplicada exponencialmente. Ao exportar a amêndoa, o Pará exporta também a base tributária.
5. Análise de Responsabilidade: É Culpa da “Má Administração”?
A pergunta do usuário busca um culpado. A análise técnica dos documentos permite mapear as falhas de gestão (má administração) e as falhas estruturais.
5.1. A Falha na Execução do FUNCACAU (Responsabilidade Estadual)
Há uma evidência clara de ineficiência administrativa na gestão dos recursos destinados ao fomento do setor.
O Fundo de Desenvolvimento da Cacauicultura do Pará (Funcacau) existe para financiar a melhoria da cadeia. No entanto, o Relatório de Atividades de 2023 da Emater-Pará aponta um dado alarmante:
- Meta Financeira Programada: R$ 1.256.579,60.
- Execução Financeira: R$ 0,00 (Zero).
- Motivo Alegado: “Reprogramação das ações durante o ano”.21
Interpretação: Em um ano de safra recorde e necessidade crítica de assistência técnica para verticalização, o estado falhou em gastar o dinheiro que estava disponível no fundo específico para isso. Isso caracteriza má administração operacional. O recurso existia, a demanda existia, mas a burocracia estatal travou a execução. Enquanto isso, o Funcacau financiou a produção de sementes (agronomia) 8, reforçando o perfil de “fazendão” em detrimento da “fábrica”.
5.2. A Responsabilidade Estratégica (Governo Estadual)
A culpa pela não-industrialização também recai sobre a falta de uma política industrial agressiva nas últimas décadas. Enquanto a Bahia blindava sua indústria com barreiras fiscais e subsídios, o Pará demorou a reagir. Apenas recentemente (Lei 9.389/2021) o estado modernizou seus incentivos 22, mas pode ter sido “tarde demais” para atrair as gigantes que já consolidaram suas operações no Nordeste. A infraestrutura (estradas e energia) na Transamazônica continua sendo um gargalo de responsabilidade estadual e federal não resolvido.
5.3. A Responsabilidade Federal
O Governo Federal tem sua parcela de culpa através da manutenção da Lei Kandir sem compensação automática e imediata, o que tira do estado exportador (Pará) os recursos necessários para investir em infraestrutura. Além disso, a falta de manutenção da BR-230 (Transamazônica) eleva o frete e inviabiliza a instalação de indústrias no interior.
6. O Caminho do “Bean to Bar” e a Esperança de Verticalização
Apesar do cenário macroeconômico adverso, existe um movimento de resistência e inovação que busca romper o ciclo colonial.
6.1. O Chocolate de Origem e as Cooperativas
Pequenas iniciativas mostram que é possível produzir chocolate no Pará, focando em qualidade (nicho) em vez de quantidade (commodity).
- Cooperativas: A Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA) e a Cooperativa Central de Produção Orgânica da Transamazônica e Xingu (CEPOTX) são exceções exitosas. Elas conseguem exportar produtos com algum grau de elaboração ou amêndoas fermentadas de alta qualidade para mercados exigentes (Japão, Holanda).4
- Prêmios Internacionais: O cacau de Medicilândia e de produtores como os do Sítio Ascurra e Tuerê tem vencido prêmios globais (Cocoa of Excellence Awards, Bean to Bar Brasil), provando que a qualidade da amêndoa paraense é superior.4 Isso permite vender o produto a preços muito acima da commodity padrão, viabilizando micro-indústrias locais de chocolate fino (“Bean to Bar”).
6.2. O Mercado de Chocolate Fino
O mercado Bean to Bar cresceu 20% em 2022.24 Embora represente uma fração minúscula do volume total, é a porta de entrada para a verticalização do Pará. Marcas locais estão surgindo, utilizando ingredientes da bioeconomia (cupuaçu, açaí, bacuri) para criar um produto identitário que a indústria baiana de massa não consegue replicar.
7. Conclusão e Respostas Diretas
Respondendo ponto a ponto às questões levantadas, com base na análise integrada dos dados:
- Por que o Pará é o maior produtor mas não produz chocolate?
- O Pará é o maior produtor devido a condições climáticas ideais, disponibilidade de terras e declínio da produção baiana por pragas. Não produz chocolate industrial (massas) devido à inércia industrial (fábricas já existem na Bahia), logística precária para escoar produto refrigerado (chocolate) da Amazônia, e guerra fiscal onde a Bahia subsidia a compra da matéria-prima paraense.
- É culpa de quem da má administração?
- A responsabilidade é compartilhada, mas há falhas específicas de gestão estadual. A “culpa” administrativa imediata recai sobre a gestão dos fundos estaduais (Funcacau), que apresentou execução financeira de 0% em programas vitais de assistência técnica em 2023 21, demonstrando incapacidade de converter recursos em fomento. Estrategicamente, governos sucessivos do Pará falharam em condicionar o apoio ao plantio à contrapartida industrial, permitindo a consolidação do modelo de enclave.
- Quanto os produtores pagam de imposto?
- Nas vendas internas: Zero (Diferimento do ICMS).
- Nas vendas para a Bahia: 12% de ICMS (descontado do preço, muitas vezes calculado sobre uma pauta fiscal de ~R$ 6,90/kg, inferior ao valor de mercado).
- Federal: 1,5% de Funrural sobre a receita bruta.
- O peso maior para o produtor não é o imposto direto, mas o custo logístico e a margem do atravessador, que reduzem seu lucro líquido.
- Quanto o estado do Pará arrecada com isso?
- Muito pouco em relação à riqueza gerada. A exportação é isenta (Lei Kandir). A venda interna é diferida. A arrecadação se concentra na saída interestadual (12%), estimada em pouco mais de R$ 100-150 milhões anuais (potencial teórico), mas severamente afetada pela sonegação e subfaturamento. O estado perde a chance de arrecadar sobre o produto industrializado (chocolate), que geraria receitas de ICMS muito superiores.
- Qual a produção nacional de cacau?
- A produção nacional estimada para a safra 2023/2024 gira em torno de 290.000 a 300.000 toneladas (somando as ~152 mil do Pará e ~140 mil da Bahia, mais pequenas produções de ES e RO). O Brasil permanece deficitário, precisando importar amêndoas para atender a capacidade industrial total.
O Pará vive o dilema clássico do desenvolvimento: é rico em produto, mas pobre em processo. A superação desse cenário exige mais do que plantar árvores; exige uma reforma na gestão pública dos fundos de fomento, uma política agressiva de atração industrial que neutralize os incentivos baianos e a resolução dos gargalos logísticos da Transamazônica.
Relatório elaborado em conformidade com as diretrizes de pesquisa aprofundada, integrando dados do IBGE, CEPLAC e Legislação Tributária Estadual.
Referências citadas
- Crise mundial na produção de cacau abre novas possibilidades ao Brasil, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/hortifruti/405696-crise-mundial-na-producao-de-cacau-abre-novas-possibilidades-ao-brasil.html
- Maior produtor de cacau, Pará avança na industrialização e produção de chocolate, acessado em dezembro 5, 2025, https://agenciapara.com.br/noticia/4655/maior-produtor-de-cacau-para-avanca-na-industrializacao-e-producao-de-chocolate
- Plano Inova Cacau 2030 – Portal Gov.br, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/ceplac/publicacoes/inova-cacau-2030/inova-cacau-2030.pdf
- Com apoio do Estado, produção e exportação do cacau paraense …, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.agenciapara.com.br/noticia/52712/com-apoio-do-estado-producao-e-exportacao-do-cacau-paraense-crescem-com-reconhecimento-internacional
- Bahia dobra valor de exportação de cacau e reafirma liderança nacional, acessado em dezembro 5, 2025, https://movimentoeconomico.com.br/geral/redacao/2025/01/22/bahia-dobra-valor-de-exportacao-de-cacau-e-reafirma-lideranca-nacional/
- Produção de cacau do Pará aumenta 4%, aponta Sedap, acessado em dezembro 5, 2025, https://agenciapara.com.br/noticia/64927/producao-de-cacau-do-para-aumenta-4-aponta-sedap
- As Contradições do Processo de Desen volvimen to … – ResearchGate, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.researchgate.net/profile/Alfredo-Homma-2/publication/320016724_As_contradicoes_do_processo_de_desenvolvimento_agricola_na_Transamazonica/links/59c8f485aca272c71bcdcac2/As-contradicoes-do-processo-de-desenvolvimento-agricola-na-Transamazonica.pdf
- Pará produziu mais de 13 milhões de sementes híbridas de cacau ano passado, acessado em dezembro 5, 2025, https://agenciapara.com.br/noticia/52129/para-produziu-mais-de-13-milhoes-de-sementes-hibridas-de-cacau-ano-passado
- Agora é lei: Bahia ganha política de incentivo à produção de cacau de qualidade – Assembleia Legislativa da Bahia, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.al.ba.gov.br/midia-center/noticias/63512
- REGULAMENTO DO ICMS DO ESTADO DA BAHIA – Sindsefaz, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.sindsefaz.org.br/web/wp-content/uploads/2022/01/lei_regulamento_icms.pdf
- Decreto Nº 23061 DE 10/09/2024 – Estadual – Bahia – LegisWeb, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=464261
- Incentivos Fiscais: conselhos Probahia e Desenvolve aprovam mais de R$ 1,6 bilhão em investimentos para a Bahia – BA.GOV, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.ba.gov.br/comunicacao/index.php/noticias/2025-11/375443/incentivos-fiscais-conselhos-probahia-e-desenvolve-aprovam-mais-de-r-16
- ÁUDIO: Incentivos Fiscais: conselhos Probahia e Desenvolve aprovam mais de R$ 1,6 bilhão em investimentos para a Bahia – BA.Gov, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.ba.gov.br/comunicacao/noticias/2025-11/375436/audio-incentivos-fiscais-conselhos-probahia-e-desenvolve-aprovam-mais-de-r
- Políticas de incentivo fiscal do Governo do Pará fortalecem a atividade industrial, acessado em dezembro 5, 2025, https://agenciapara.com.br/noticia/50650/politicas-de-incentivo-fiscal-do-governo-do-para-fortalecem-a-atividade-industrial
- ICMS – SEFA – PA, acessado em dezembro 5, 2025, https://sefa.pa.gov.br/internal/services/ifc
- Decreto nº 400 de 29/06/1995 – Estadual – Pará – LegisWeb, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=146691
- Resolução SEFAZ Nº 52 DE 27/12/2024 – Estadual – Amazonas …, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=471452
- Tributação no Agronegócio em Belém – PA: entenda quais São e como funciona, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.northconta.com.br/tributacao-no-agronegocio-em-belem-pa/
- Lei Kandir: Atuação do Pará garante acordo e projeto segue para sanção presidencial, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.agenciapara.com.br/noticia/23999/lei-kandir-atuacao-do-para-garante-acordo-e-projeto-segue-para-sancao-presidencial
- Sefa apreende gado e cacau no Araguaia | Agência Pará, acessado em dezembro 5, 2025, https://agenciapara.com.br/noticia/72882/sefa-apreende-gado-e-cacau-no-araguaia
- Relatório de Atividades 2023 – EMATER Pará, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.emater.pa.gov.br/storage/app/media/ARQUIVO%202024/Rel%20Ativ%202023%20Emater.pdf
- Lei Nº 9389 DE 16/12/2021 – Estadual – Pará – LegisWeb, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.legisweb.com.br/legislacao/?legislacao=424738
- Produtores do Pará brilham no Prêmio Bean to Bar Brasil 2025, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.cnabrasil.org.br/noticias/produtores-do-para-brilham-no-premio-bean-to-bar-brasil-2025
- Marcas chocolate bean to bar crescem 20% e apostam no período de Páscoa para mostrar inovação e qualidade, acessado em dezembro 5, 2025, https://www.beantobarbrasil.com.br/blog/newsletter/marcas-chocolate-bean-to-bar-cresce-20-e-apostam-no-periodo-de-pascoa-para-mostrar-inovacao-e-qualidade


